O Corvette split window de 1963 foi uma bela obra tanto de design quanto de mecânica com a ajuda de Zora Arkus-Duntov e os aprendizados com o CERV I. Duntov desenvolveu um sistema de suspensão traseira com o CERV I que foi aplicado no Stingray racer de Mitchel e depois também utilizado no Stingray de série.
Em 1963, o Corvette estava ficando cada vez mais europeu no sentido de carro esporte. Pela primeira vez uma versão berlineta, ou cupê, foi oferecida ao público. Larry Shinoda foi responsável pelo desenho do carro que tinha sido inspirado em uma de suas criações para Bill Mitchell, o lendário Stingray racer de 1959.
Mas além de criar a versão berlineta e conversível do Corvette 63, Shinoda recebeu a tarefa também de criar uma versão 4-lugares do Corvettes. Isso mesmo! Um Corvette para quatro.
Desde o início o Corvette e sua existência foi ameaçada por outro esportivo da Ford, o Thunderbird. Esportivo talvez seja o termo errado. O fato é que para o público americano a idéia de esportivo era algo completamente diferente do conceito na Europa e no resto do mundo. Na América, carro esporte tem dois lugares porém é grande, imponente, pesado, com suspensão macia e um grande motor V-8. Isso é o que era o Thunderbird.
Já o Corvette era uma proposta basicamente europeia inspirada no Jaguar XK120 mas com origem no Glasspar G2, um pequeno esportivo de compósito de plástico e fibra de vidro feito para a esposa do Major Ken Brooks sobre um chassis Jeep Willys. O carro de Brooks teve uma história interessante. Ao presentear de forma frustrada sua esposa com um Jeep Willys, que se nega a usá-lo, Brooks altera o carro usando seu chassis, uma carroceria de plástico e um motor V-8. O G2 foi apresentado à GM devido ao seu conceito de carro de compóstio plástico-fibra de vidro e Harley Earl, designer-chefe da GM, achou-o muito interessante. Earl observava que os soldados voltando da guerra traziam MGs, Alfas e Jaguar esportes e achou que a América estaria mais bem servida com um pequeno e ágil carro esporte nos moldes europeus ao invés da típica banheira americana chamada de carro esporte.
Porém nos dois primeiros anos, com apenas um motor 6-cilindros em linha de 150 e depois 155 hp, o Corvette vendeu pouco mais de 300 examplares. Em 1955 a Ford lança o Thunderbird, que vinha com motor V-8, um belo design e um tamanho e característica muito mais para o gosto americano. Foi um sucesso e vendeu muito mais que o Corvette, apesar que em 1955 o Corvette já contava com motor V-8 small block, cortesia de níguem menos que Zora Arkus-Duntov.
A venda do Thunderbird foi muito superior à do Corvette, de forma que representava uma humilhação à GM. O Thunderbird 1957 é na minha opinião o mais belo dos T-birds, mas em 1958 a Ford resolveu colocar 4 lugares no Thunderbird e mudou o belo design original, como resultado dobram as vendas do carro. Na época não se entendia muito direito que o Corvette era outro nincho bem diferente do T-Bird. O fato é que dentro da GM, o Thunderbird sempre foi considerado o concorrente do Corvette e assim que os executivos de marketing mediam a performance de vendas do esportivo.
O mais belo dos T-Birds ano 1957. Parachoques restilizados e pequenas bartanas traseiras no estilo rabo-de-peixe.
Em 1963, com o novo Corvette, Ed Cole que era o gerente geral da GM, mandou fazer um estudo de um Corvette de 4 lugares para brigar diretamente com o Thunderbird. Dá para imaginar a reação de Arkus Zora -Duntov e dos puristas amantes do Corvette. Seria algo equivalente à reação do público ao atual Panamera da Porsche. Mesmo assim, Shinoda desenhou o carro, que ficou bem elegante. O interessante é que a Porsche também conhece o design do Corvette 4-lugares de Shinoda e é possível ver uma semelhança na linha do teto do Panamera com o protótipo de Shinoda. A idéia de Shinoda foi aumentar as portas e a distância entre eixos de forma a criar uma seção mais reta que acomodasse um banco traseiro. Conseguiu fazer isso sem alterar muito o desenho original. Resultado: ficou até muito bom.
O perfil do Corvette 1963 de 4 lugares de Shinoda, um desenho harmonioso. Notem o tamanho bem maior da porta.
Mas voltado ao Stingray 4-lugares de 1963. Quando Duntov o viu, torceu o nariz, bem como toda a equipe que se dedicava ao Corvette, Chuck Jordan (o diretor de design na época) e até Shinoda. Existia um ar de negatividade em torno do carro justamente por ir contra ao que o Corvette representava. Mas essa não foi a primeira vez que tentaram alterar o Corvette para mais de dois lugares. As primeiras tentativas vieram na época dos Motorama da GM sob o comando de Harley Earl. Foram feitos dois carros-conceitos, um cupê chamado de Corvair e uma station wagon batizada de Nomad.
Com o conceito de Shinoda, havia uma parte da GM que torcia pelo projeto. Em 1954 as vendas do Corvette eram pouco representativas de forma que a GM cortou o Corvair e a Nomad. Naturalmente, usou ambos nomes em produtos diferentes e em metal, não em plástico e fibra de vidro.
Já para o 4-lugares de 1963, a produção chegou bem perto de ser uma realidade. Porém um episódio curioso envolvendo o alto escalão da GM iria mudar definitivamente os planos e alegrar os puritas. Foi construido um único protótipo do 4-lugares, que é o carro que está nas fotos. Nunca foi apresentado ao público, apenas dentro da GM. Em um determinado dia, Jack Gordon, o presidente da GM, foi convidado pelo departamento de estilo para conhecer o protótipo e o comparar lado a lado com a versão 4-lugares do Ford Thunderbird.
Gordon quis conhecer o Thunderbird, entrou na carro, sentou atrás para ver a praticidade do 4-lugares feito pela Ford. Pode não parecer muito o ato de sentar atrás em um carro, mas para Gordon, que tinha estatura 1,87 m, o espaço traseiro de um carro como esses era importante.
Logo a seguir, seria a vez do Corvette. Gordon fez a mesma coisa. Entrou no banco de trás, puxou o banco da frente de volta e o travou no lugar. Claro, num protótipo nem tudo é testado como deve e a alavança de mover o banco não era exceção. Momentos de angústica logo seguiram ao ritual de Gordon, uma vez que ele tentou sair do carro e a alavanca do banco da frente quebrou, deixando Gordon sem ação no banco traseiro. O chefe estava preso dentro do Corvette de 4 lugares! Gordon começou a sentir cãimbras e também decidiu recitar várias palavras do vocabulário inglês um tanto demasiadamente ameaçadoras.
Eis que dois técnicos da GM tiveram que remover o banco direito para extrair o chefe, que sobreviveu para contar a história. Interessantemente, o protótipo foi destruído e nunca mais se falou no assunto. Porém, anos antes de sua morte, Shinoda revelou que o que realmente barrou o Corvette de 4 lugares foi aquela alavanca que prendeu o chefe. Após o episódio, Gordon ordenou o término do projeto segundo conta Larry Shinoda.
Qualquer entusiasta que conhece a história do Thunderbird e Corvette, já deve ter se perguntado por que a Ford mudou o belo roadster de 2 lugares para 4 e por que a Chevrolet nunca fez um Corvette de 4 lugares. A resposta está nessas fotos. Uma pena que a GM destruiu o protótipo dois anos depois. Porém os entusiastas agradecem que um Corvette com mais de dois lugares nunca aconteceu. A visão do salão de vendas de um conncessionário Chevrolet em 1963 seria algo bem diferente do que foi. Naquela época, como hoje, o Corvette sempre ocupou um lugar de destaque no salão, ajudando a atrair pessoas para dentro que acabavam comprando outros produtos da marca. Essa também é a utilizade de um ícone automobilístico para uma fabricante. E o Corvette sempre despertou os mais fortes desejos automobilísticos por várias gerações na sua história de quase 60 anos. Quem sabe a Porsche tenha encontrado a receita para um carro esporte de 4 portas que a Chevrolet não achou. Porém Porsche e Corvette não são um Maserati e assim suas versões 4-lugares baseadas nos ícones 911 e Corvette despertam um grande desprezo entusiástico por parte dos puristas.
2 comentários:
Q post é esse! Muito interessante!
Ainda bem q o chefe ficou preso! rs...
Esse 4 lugares ficou bonito, eu gostei.
De qualquer forma, um carro 4 lugares é muito diferente de um 2 lugares; usar a mesma "fórmula" de um no outro é quase suicídio; como aconteceu com o Porsche.
Nos primeiros desenhos do Panamera, todos babaram... Mas quando o carro apareceu a chiadeira foi geral.
Simplesmente não funciona usar o visual do 911 que é um clássico com muitas décadas em um carro tão maior. Mas a ânsia de aumentar as vendas, agradar os acionistas e etc. leva as empresas a isso.
Na minha opinião o Panamera "nasceu" errado como um todo visualmente falando.
A toda poderosa Bugatti talvez lance o seu panamera maquiado com a sua marca e mesmo assim não funciona esteticamente analizando os volumes. Melhorou, sim... Mas ainda fica muito esquisito.
Pq? Pq o habitáculo do Panamera é alto e largo para privilegiar o conforto e a acessibilidade.
Notem que o Aston-Martin Rapide também tem 4 portas, é lindo... Mas o espaço atrás para quem tem 1.80m mais é sofrível...
Não tem muita mágica!
Ou a Porsche encontra outra solução para o Panamera... Ou vai continuar vendendo um carro feio!
Se eu fosse a Porsche iria pelo caminho Bugatti EB-112 desenhada magistralmente pelo Giorgeto Giugiraro; para mim a sua obra prima!
Tem conserto sem mudar a plataforma, tem... Mas vai dar muito trabalho, especialmente na traseira, o ponto mais fraco!
Sinceramente, só quando a Panamera mudar de plataforma que eu espero melhoras significativas no design externo.
Abraços.
Nunca soube dessa Corvette 4 lugares. O conceito é semlhante ao Jaguar XK-E 2+2.
Enquanto a Corvette é um carro esporte, o T-Bird 55-57 era um "personal car", seja lá o que isso signifique.
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