Como que você define sucesso em corridas? Se você for pelo padrão de números de vitórias e resultados, então esse Corvette 1962 não só é um vencedor mas também poderia ter a sua foto no dicionário Aurélio sob a definição de excelência. Em 1962 esse C1 era o carro mais dominante na categoria de carros de produção da SCCA A. Ele participou de 14 provas naquele ano e conseguiu 12 vitórias numa época em que os carros eram quase compatíveis em termos de desempenho.
Mas havia outra missão para esse Corvette que ia além de mostra-lo como o único esportivo de verdade Americano. A Gul Oil, encabeçada por Grady Davis, usava vários Corvettes de sua propriedade para desenvolver lubrificantes uma vez que o teste das exigências de uma pista não podia ser replicado num laboratório da época. Assim, esse carro se tornou um laboratório sobre rodas para a Gulf.
A largada das 12 horas de Sebring de 1962 no estilo Le Mans
Davis tinha também muito bom apoio da General Motors e Chevrolet para deixar o carro do jeito que ele queria. Devemos lembrar os leitores, do Corvette Brasil, que naquela época a GM estava oficialmente fora das competições como já contamos antes. Porém, na Chevrolet haviam muitas coisas acontecendo e saindo pela porta traseira que quase ninguem sabia e, em geral, envolvia Zora Arkus-Duntov. Muitos desses funcionários da GM poderiam ter perdido seus empregos, mas o prazer de faze-lo é muito grande e tudo acontecia na surdina. Isso incluia vender um carro preparado para competição para um cliente final (Davis) através de um certo concessionário Chevrolet? Algum leitor do Corvette Brasil é capaz de adivinhar qual concessionário podia ser esse? O nome Yenko soa familiar para vocês?
O número 2 em velocidade.
O carro foi comprado através da Yenko Chevrolet. E não era algo comum. Vejam, em primeiro lugar tinha a mão da Gulf Oil e certas pessoas ilustres envolvidas com o projeto como o dentista/piloto Dr Dick Thompson e os outros dois pilotos Duncan Black e Doc Wylie também lengendários. Saber que se tratava de um Corvette com tudo de melhor: injeção de combustível, freios especiais, tanque maior e outros equipamentos tornava essa operação um verdadeiro épico, não acham?
As modificações na janela traseira com plexiglas para acomodar o bocal do tanque.
Porém as modificações e equipamentos especiais instalados pelo Chevrolet não foram os definitivos. Depois que o carro foi entregue por Don Yenko para Grady Davis ele ainda foi mais modificado paara se preparar para as corridas endurance de longa duração. O tanque de combustível maior era uma peça especial confeccionada em fiberglass com capacidade para 37 galões americanos, ou seja uns 140 litros, que substituira o já especial tanque RPO 488 de 24 galões instalado especial pela Chevrolet. Com o tanque de 24 galões uma modificação na janela traseira foi necessária uma modificação para acomodar o bocal de reabastecimento como podem ver nas fotos.
As regras de segurança da FIA da época diziam que um pisca azul deveria ser ligado à noite.
Os mostradores foram trocados por especiais de corrida da Stewart-Warner, o banco do piloto foi trocado por uma concha de alumínio e as janelas laterais de vidro foram substituidas por plexiglas mais leves. Além disso um rádio da Motorola com também transmissor (na época alguns sistemas permitiam apenas ouvir, não transmitir) foi instalado junto com as luzes mandatórias da FIA. Uma faixa logintudinal azul atravessava o carro e as laterais foram pintadas de azul uma vez que em 1962 não haviam mais Corvettes de duas cores. Outra modificação externa foi a remoção dos parachoques de série sendo trocados por peças tubulares de aço.
O "cove" lateral pintado de azul com os emblemas do carro.
Quando esse C1 estava pronto para competir, ele foi enviado para Daytona onde estreiou na Daytona National. Com o dentista voador ao volante, Dick Thompson, conseguiu um ótimo segundo lugar na classe A de produção. A próxima prova seria as 3 horas de Daytona Continental em duas semanas e foi lá o palco da primeira vitória de Thompson com seu Corvette 62. Após isso, em Março, com Doc Wylie e Duncan Black ao volante da clássica 12 horas de Sebring o carro não só aguentou a maratona mas ainda venceu na classe totalizando 3 pódios em seguida.
Notem o parachoque de aço tubular, a falta dos chromados e a proteção para os faróis.
Porém, uma desistência na proxima etapa fez com que o motor 327 que nunca tinha saido do carro fosse trocado por outro com igual. O interessante foi que com o mesmo motor o carro iria ganhar mais 10 provas seguidas totalizando 10 vitórias em 14 provas. Incrível!
Dick Thompson mostrando o eixo rídigo traseiro em ação.
No final da temporada de 1962 foi também o fim de linha desse Corvette 62 de Davis. Assim como era de seu costume ele vendeu o carro que acabou indo parar nas mãos de Tony Denman que competiu no ano seguinte com esse carro. Davis adquiriu um novíssimo RPO Z06 Sting Ray 1963 para a temporada de 1963. Para os leitores mais tradicionais, esse é aquele carro que nos inspirou à escrever a história de Duntov.
A última parada noturna nas 12 horas de Sebring.
Depois dos seus momentos de glória com Davis e Denman, esse 1962 foi relegado à apenas mais um carro usado sendo utilzado como carro de passeio nos próximos 16 anos. No final dos anos 70 o então dono notou algumas coisas estranhas na carroceria do carro e resolveu levantar a história dele o que o levou de volta à Tony Denman que, além de confirmar tudo, ainda tinha guardado o motor original, o tanque grande original e o capô original bem como outras peças de competição do carro. Mais uns 20 anos depois e o carro foi levado às oficinas de Kevin Mackay, muito conhecido na comunidade dos Corvetteiros. Por incrível que pareça, todas as peças da carroceria do carro eram originais, com excessão do capô. Dessa forma o carro passou por uma restauração tipo frame-off. O carro agora encontra-se com o primeiro motor que abriu o bico na quarta prova, o mesmo com que saiu de fábrica em St Louis. Aliás, isso o torna um dos poucos Corvette de corrida históricos que possuem o seu motor original.
Notem os mostradores Stewart-Warner adicionados ao painel do C1. Pode-se notar também o sistema da Motorola, muito avançado para a época.
Uma vez restaurado, o Corvette 62 de número 2 foi fazer história novamente. Isso porque o carro foi vendido no leilão de Goodings collector-car durante o concurso de Pebble Beach na bela cidade de Monterey em 2008. O carro alcançou um valor recorde para Corvettes de eixo rígido com a marca de $1.485.000 Dólares! Logo em seguida durante o Amelia Island Concours d'Elegance de 2009 o carro ganhou o prêmio David E. Davis Jr. (o famoso jornalista) pelo melhor carro Americano do pós guerra. Logo em seguida fez uma aparição no tradicional Bloomington Gold's special collection of historic racing Corvettes. Hoje em dia esse carro faz parte da coleção de Chris Andrews (o cara que pagou quase $1.5 milhões por ele) que foca sua coleção em carros de competição importantes. Na sua garagem há um Watson roadster Indy car, um dos primeiros Shelbys e alguns Spring cars antigos.
Concha de alumínio para o piloto equanto que o assento do passageiro tinha que ser mantido pelas regras da FIA para essa classe.
Andrews é um estudioso de história de competição automotiva e o seu interesse pela história do Corvette 62 da Gulf o fez adquirir esse carro. Segundo ele o que mais gosta é o visual bem como a performance desse modelo. Satisfeito, comemora que o carro tenha sido leiloado em 2008. Ele leva seu carro para alguns eventos de vez em quando. Inclusive dirige o carro para casa, algo digno para um Corvette que nasceu para ser dirigido. Porém ele não entra o carro em corridas históricas por os pneus são quase impossíveis de achar e para apenas fabricar o molde para se fazer um pneu desses (Goodyear Blue Sreak Sports Car Special biasplies) custaria $35.000 Dólares. Agora, Chris Andrews está construindo outro 1962 de competição que será preto com listras brancas porém com um chassis da Art Morrison ao invés do chassis original que justamente terá o propósito de oferecer diversão nas pistas.
O 327ci com injeção usado nas primeiras 4 corridas e que foi instalado na fábrica de St Louis.
Apesar da última corrida que esse 1962 da Gulf entrou ter sido em 1963, o carro é ainda lembrado na memória dos aficionados por Corvette o quanto havia de excelência de engenharia desde aquela época o que se traduz no que vemos hoje em dia tanto nos showroom da Chevrolet quanto na pista pela Corvette Racing, TAM e outras equipes que competem com o Corvette mundo à fora. Não há também nada mais fascinante que os carros da Gulf da década de 60 e 70 na história de competição automobilística.
Um comentário:
muito show.
que historia!
Abs
Ed Cordeiro
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