O capô moldado em peça única de plástico reforçado com fibra de carbono era em estilo concha e inspirado no Jaguar E-Type. Ele abria pela frente para revelar todo o motor e a suspensão dianteira o que ajudava muito na manutenção. Foi um dos primeiros carros a ter uma preocupação maior com a estética do motor que estava lá para ser admirado tanto quanto o carro. No capô haviam passagens de ar que passavam pelos filtros de ar na frente até as entradas de ar de magnésio do motor.. Essas passagens de ar também serviam como estruturais ao capô que seria muito flexivel se as não tivesse devido ao seu tamanho e formato.
Notem os faróis que giravam 180 graus para ficarem alojados dentro do capô e proporcionar uma superfície mais aerodinâmica quando estavam retraídos. Ver os faróis operando num C4 é sempre uma experiência legal que ainda disperta a admiração das crianças depois de mais de 20 anos. Algo que hoje não existe mais nos carros modernos e com pequenos e eficientes faróis.
O motor era o mesmo V8 usado no último C3 de 1982, chamado de Cross-Fire por ter dois injetores de combustível, um para cada banco de cilindros. Era um motor de comando central e que produzia apenas 205 hp ainda que a maioria era atingida em baixas rotações. Esse motor foi usado apenas em 1984.
Todos os C4 de 1984 eram cupês (o conversível só viria em 1986) e todos tinham um teto targa único que poderia ser alojado no porta malas. Inicialmente o teto foi projeto para ser facilmente removível através de alavancas como no C3. Porém em um teste de um C4 pré produção, o teto acabou explodindo à apenas 120 mph (200 km/h) e assim foi decidido usar 4 parafusos como ilustramos com o C4 1992. As alavancas voltariam com o C5 em 1997. O design do C4 permitiu que os pilares A do para brisa fossem pequenos para aumentar a visibilidade. Em contra partida, ao se retirar o teto targa (que também era estrutural) o carro perdia em rigidez ainda que proporciona-se ao dono o prazer de andar em aberto.
O chassis consistia numa estrutura tipo escada, com grandes vigas quadradas que ficavam abaixo das laterais. Os bancos eram montados logo abaixo dessas vigas o que tornava a entrada e saída do veículo complicado ainda que com certo charme. Mini saias, em geral, eram um grande desafio para sair do carro. O freio de estacionamento era montado do lado esquerdo da parte de dentro de uma das vigas o que dava o toque de carro exótico ao C4. Voltando ao chassis, as vigas laterias conectavam a suspensão e o motor na parte da frente. O túnel da transmissão era fundo e largo e dava para acomodar bem o cardã e uma espinha de alumínio que conectava a transmissão, cardã e o diferencial numa unidade única e bem rídida. Um design interessante como pode ser observado na foto abaixo. A suspensão independente traseira também era fixada nessa espinha num outra estrutura de alumínio que ficava à 90 graus e montada logo acima como pode ser também observado.
As rodas do carro eram de 16 polegadas em diâmetro e o seu design ajudava na aerodinâmica do carro mas também proporcionavam um melhor espaço para a superfície de frenagem permitindo um melhor resfriamento dos freios e assim diminuindo a fadiga. Os pneus foram desenvolvidos especialmente para o C4 pela Goodyear e eram bastantes largos para um carro de produção: 8.5 polegadas de tala na frente e 9.5 atrás. Os largos pneus, juntos com a suspensão firme e dura e o baixo centro de gravidade do C4 permitiam alucinantes 0.90g de aceleração lateral, isso em 1984!
A carroceria era feita de plástico reforçado com fibra de vidro injetado e estampado. Era encaixado na carroceria de forma que o encaixe central era coberto por um friso de borracha que envolvia o carro pouco abaixo da linha de cintura. Os parachoques modernos podiam absorver impactos até 5 mph (8 km/h) sem danos. O carro era interessante porque não tinha nenhuma grelha, na frente apenas os faróis auxíliares e os pisca. Todo o ar que o carro precisava era obtido por uma saia e spoiler debaixo do nariz do carro e o radiador era montado quase deitado.
O painel do Corvette 1984. Notem a semelhança ao painel do Space Shuttle. Notem também os bancos de tecido. Na época ainda era possível se comprar com bancos de tecido uma vez que o couro era opcional. Devido à falta de material isolante e suspensão dura, a cabine era barulhenta com vários ruídos e chiados. Mas porque isso poderia ser ruim? Afinal o C4 é um carro esporte e não um Cadillac.
Os mostradores do Corvette eram em crystal líquido colorido. Notem que o velocímetro lia no máximo até 85 mph (136 km/h) no gráfico devido à legislação Americana da época. Porém no mostrador digital haviam 3 dígitos. Outra curiosidade era o odômetro que era analógico como em qualquer carro normal na época isso porque a technologia não permitia armazenar os dados corretamente quando a bateria era desconectada. Na época esse painel foi sensação e copiado por vários carros que também queria ter uma conotação high tech. Porém com o tempo, os verdadeiros entusiastas sentiam falta de mostradores analógicos, algo que foi quase totalmente corrigido em 1990 com todos os mostradores, menos o velocímetro, de volta ao elegante sistema analógico. Outra coisa notável era o formato do conta giros digital. O gráfico mostrava o pico de potência na rotação correta e depois havia uma queda. Isso era proposital para informar o motorista a melhor acasião de trocar marcha e a forma mais eficiente de tirar o máximo do motor.
Para corrigir um dos maiores problemas do formato de garrafa de coca-cola do C3, o carro foi alargado de forma a aumentar o espaço para os ombros dos ocupantes. A aerodinâmica também deixou de ser uma de tijolo como no C3 (que apenas parecia aerodinâmico mas não era) e o carro ficou com um perfil super suave com a aparência de um carro exótico e com um coeficiente de arrastro bem respeitável de 0.34 o que significava 23% de melhora sobre o Corvette 1982.
Um sistema de caixas de som BOSE bem sofisticado foi desenvolvido com exclusividade para o C4(como pode ser visto no video). Cada speaker tinha seu amplificador próprio e um sistema de redução de ruído foi projetado especialmente tanto para rádio como cassette.
Em termos de transmissão, duas coisas foram feitas. Devido à regulamentação de consumo da época a caixa de 4 marchas Muncie (último foi no C3 1981, todos os 1982 eram automáticos) não seria suficiente. Portanto, no lugar foi desenvolvido uma evolução computadorizada desse câmbio Muncie com um overdrive eletrônico na segunda, terceira e quarta marchas. O trabalho foi feito pela Doug Nash e ficou conhecido como câmbio Doug Nash 4+3.
Na prática as marchas eram sempre longas e havia um kick down automático (como num câmbio automático) que reduzia o diferencial caso o acelerador fosse pressionado flat out. Algo estranho mas funcionava ainda que com o passar dos anos se tornou algo problemático para alguns usuários. O overdrive era na verdade uma engrenagem planetária acoplada logo atrás do câmbio como pode se notar no video. Foi dai que surgiu o termo CAGS, ou seja, Computer Aideded Gear Selector. Mas, por mais duro que seja admitir isso, o outro tipo de câmbio que era um automático de 4 marchas (na época a grande maioria dos automáticos eram de 3 marchas) era muito melhor e mais honesto que o Doug Nash 4+3 ainda que funcionava melhor. O primeiro Corvette que dirigi na vida foi um C4 1987 vermelho com esse câmbio automático. Superou minhas expectativas. Claro, em 1989, como citamos na história do ZR-1, um câmbio ZF 6 marchas maravilhoso foi adicionado ao Corvette C4 que tornou o câmbio manual bem mais entusiasta que o automático.
Outra solução de engenharia muito interessante que o C4 introduziu foi uma mola de feixe único transversal feita de fibra de vidro reforçada com epoxy que era usada tanto na suspensão dianteria como na traseira. Haviam várias vantagens para isso como por exemplo: a mola dura muito mais que as de aço, é muito pequena e leve, deixa o centro de gravidade do carro baixo, é firme e funciona bem.
Existem vários ignorantes, como o folclórico Jeremy Clarkson do programa Top Gear (nesse caso ele estava sendo Britâncio e folclórico, não ignorante), que durante anos criticaram o Corvette e compararam a sua suspensão à de uma carroça. Podemos até aceitar isso no caso da suspensão traseira do C3, mas nunca na do C4. Motivo? Bem, a maioria dos carros modernos de Le Mans e ALMS usam a mesma configuração adotada no C4.
Podemos citar os seguintes:
- Acura ALMS.
- Porsche RS Sypder LMP2
- Bentley Speed 8 (2003) suspensão dianteira.
Entre outros.
Nas voltando à suspensão do C4, o conjunto tinha ainda barras estabilizadoras bem leve e partes de alumínio estruturais assim como os pistões de freio também em alumínio. Na traseira o sistema era multi-link convencional e na dianteira triangulos duplos.
O carro também tinha o volante do motor de dupla massa. Isso consistia num volante do motor convencional (flywheel) com um anel de metal auxiliar montado com peças de borrachas na sua periferia. Esse design reduzia vibrações e garantia maior suavidade do motor e melhor entrega de potência em baixas rotações.
Em 1986 outra novidade foi um sistema eletrônico anti furto na chave, o primeiro em carros de série. Ele consistia de um resistor montado na chave de ignição que fazia mais dificil o roubo do carro. O único problema é que haviam apenas 15 tipos de valores de resistência de forma que eu acho questionável a sua eficiência. Recentemente tive que fazer uma cópia da chave do C4 e para isso primeiro se coloca a chave num leito para ver o código e depois se compra uma chave não cortada com aquela resistência e assim a máquina corta na combinação correta.
O C4 causou tanta sensação que a maioria dos seriados Americanos da época tinha um. O maior exemplo desses foi o carro do Face (cara de pau, personagem do ator Dirk Bennedict) do A team (Esquadrão classe A) que era um Corvette branco automático com faixas laterais vermelhas especiais (não de série).
Em 1985 no filme do agente 007 e último de Roger Moore, A view to a kill. Uma agente Russa (vivida por Fiona Fulletorn hoje agente imobiliária) com quem Bond passa a noite num spa dirigia um Corvette prata automático pela Califórnia.No filme Heat de Robert Deniro e Val Kilmer de 1995 mostra Kilmer num C4 junto com Ashley Judd. Outros seriados da época como Knight Rider, Manimal, Dallas, Automan tiveram a participação de um C4.
Hoje é possível comprar um C4 de 1984-1985 premiado pela NCRS e poucas milhas por uns $12.000 Dólares nos EUA. Uma barganha para algo que será um clássico garantido.
É muito difícil achar sobreviventes do primeiro C4 1984. Muitos estão em condições precárias que não valem a pena restaurar devido ao valor ou falta de valor desses carros atuais. Em 2005 cheguei muito perto de comprar um 1984 com câmbio Doug Nash 4+3 que era preto e tinha o interior prateado. O carro estava impecável de dono único que pedia apenas $8.000 Dólares por ele. Acabei não comprando o carro porque queria um C4 1992 e não um original com câmbio 4+3. Hoje pensaria diferente.
O carro dourado dessas fotos estava agora (no momento de finalizar o artigo) à venda no eBay. Completamente impecável e ganhador de 98 pontos de 100 no Corvette at Carlisle e com apenas 12.000 milhas originais, uma verdadeira capsula do tempo. O carro estava sendo leiloado mas havia o opcional de compra-lo por míseros $12.500 Dólares. Esse carro é em duas cores, que era algo comum quando o Corvette começou a ser fabricado em Bowling Green devido à nova e avançada câmara e ferramental de pintura. Está todo original e vem com o câmbio automático de 4 marchas que era bem avançado para a época.
Hoje ainda é possível se adquirir um dos primeiros C4 originais em condições espetaculares de conservação, como esse carro, por um preço muito atrativo. Tenho certeza que daqui à alguns anos um carro como esse irá valer muito mais proporcionalmente. A grande vantagem de se colecionar bons carros é que o retorno, com o tempo, é muito mais garantido que qualquer outro investimento.
O C4 foi um carro que marcou época e foi o primeiro a tornar o Corvette um carro esporte de qualidade internacional.
Para terminarmos a história do C4 de 1984 vamos citar as principais melhorias que o C4 teve durante os anos.
1984 :
- Lançamento em Março de 1983 como modelo 1984. O carro ganhou elogias da impressa internacional especializada.
1985 :
- Novo motor L98 que aumentou a potência de 205hp para 230hp. Novo sistema de injeção mais eficiente da Bosh.
1986:
- Volta do conversível que não existia desde 1975.
- Cabeçotes de alumínio foi colocado no L98.
- ABS se tornou ítem de série.
- Sistema anti furto na chave de ignição.
1987:
- Motor recebe novos rolamentos de válvula e a potência sobe para 240 hp.
- O opcional B2K - Callaway Twin Turbo é disponível ao Corvette por quase $20.000 Dólares à mais.
1988:
- A edição de trigésimo quinto aniversário é criada.
1989:
- Câmbio ZF de 6 marchas.
- Suspensão magnética FX3 que permitia regular os amortecedores através de um botão giratório no console.
1990:
- Novo painel para o Corvette com airbag para o motorista.
- A opção ZR-1.
- Sistema de monitoramento do uso/idade do óleo do motor.
1991:
- Novo design para a carroceria do C4.
- Último ano do Callaway Twin Turbo de fábrica.
1992:
- Motor LT1 com 300 hp, sistema de refrigeração de fluxo invertido da Lotus.
- Controle de tração da Bosh ASR.
- Vários refinamentos no interior e mecânicos.
- Pneus maiores 275 nas quatro rodas para o LT1.
1993:
- Potência do ZR-1 aumentou de 375 hp para 405 hp para competir com os 400 hp do Dodge Viper.
- Edição de aniversário de 40 anos em vinho.
- Pneus run flat de série diferentes em cada roda.
1994:
- Airbag para o passageiro e redesenho do interior das portas.
- Voltante de apenas 2 raios ao invés dos 4 raios do 1991,1992 e 1993.
- Versão conversível ganhou janela traseira de vidro ao invés de plástico.
1995:
- Último ano do ZR-1.
- Freios maiores do ZR-1 para toda a linha.
- Novo desenho da saida de ar do motor atrás da roda dianteira.
- Réplicas para o Indy 500 pace car de 1995, todos conversíveis.
1996:
- Último ano do C4.
- Collectors Edition que vinha em prata.
- Versão Grand Sport.
- Motor LT4 de 330hp opcional para os carros com câmbio manual.
Video de apresentação do Corvette. Notem o protótipo de 1983 vermelho com suas pequenas rodas de aro 15. O carro não tinha nem sido terminado no interior. Esse carro seria destruido depois. Já o azul do video também é um pre série porém esse já tinha as rodas definitivas que seriam lançadas em 1984.
Como o C4 tinha várias inovações técnicas a GM fez esse video mais detalhada da engenharia envolvida em desenvolver o carro e sua fabricação.
O carro é muito interessante e histórico: a primeira Corvette hi-tech. Só não gosto desse painel digital tipo Las Vegas noturna...
ResponderExcluirBabei aqui Carlos!!!!
ResponderExcluirBabei com o post, com o carro, com os comerciais, com o preço desse clássico por essa ninharia...
Só aqui entre nós... Se vc tivesse espaço tinha comprado esse dourado, não?
Só uma coisa, o Kitt do Knight Rider não era um Trans-am? É quase a mesma coisa... Mas o Trans é um pouquinho mais fraco e tinha banco traseiro se não me engano.
Abração e por favor pare de postar assim, não consigo trabalhar! KKKK
Lawrence,
ResponderExcluirExato o Kitt era um Pontiac, mas o que escrevi foi que o C4 teve participação no seriado assim como no Automan e demais seriados da época.
Quando tiver mais espaço vai ser um C2 que vai entrar na garagem.
Um abraço.
Cara, tem um carinha lá no Autoentusiastas que meio que copiou esses seus artigos do C4 e do ZR-1. Mas tem cada figura, ô louco! Será que ele já teve ou sentou pelo menos num carro desses como os de vocês?
ResponderExcluirCarlos, um porre Corvetistico este teu artigo....parabéns.
ResponderExcluirParabens pelo artigo postado. É muito raro encontrarmos artigos que vão a fundo na criação de determinados modelos com uma descrição tecnica detalhada como esta.É um trabalho que merece ser guardado.
ResponderExcluirSensacional o artigo, parabéns!
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